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Ação declaratória de inexistência de obrigação tributária acessória – Município de Birigui – Proibição aos tabeliães e escrivães de lavrarem instrumentos, escrituras ou termos jurídicos sem o prévio recolhimento do ITBI, impondo-lhes a obrigação de transcrição da guia de recolhimento do imposto nos instrumentos ou termos jurídicos, sob pena de multa – Impossibilidade – Matéria legislativa de competência privativa da União (CF, art. 22, XXV) – Competência do Tribunal de Justiça de organizar suas secretarias e serviços auxiliares e de exercer controle sobre atos e serviços auxiliares da justiça, abrangidos os notariais e os de registro (Constituição Estadual, arts. 69, II, b e 77) – Precedentes – Impossibilidade, ademais, de exigir o imposto antes da ocorrência do fato gerador, que se dá com o registro da transferência da propriedade no Registro de Imóveis – Sentença de procedência – Pleito do autor deduzido em recurso adesivo de majoração dos honorários advocatícios de sucumbência – Admissibilidade – Recurso do Município não provido – Recurso adesivo do autor provido.

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ACÓRDÃO – Decisão selecionada e originalmente divulgada pelo INR –

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 0016495-73.2009.8.26.0077, da Comarca de Birigüi, em que é apelante PREFEITURA MUNICIPAL DE BIRIGUI, é apelado ROBSON DE ALVARENGA.

ACORDAM, em 18ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Recurso do Município não provido. Recurso adesivo do autor provido. V.U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores BEATRIZ BRAGA (Presidente sem voto), WANDERLEY JOSÉ FEDERIGHI E BURZA NETO.

São Paulo, 29 de novembro de 2018.

CARLOS VIOLANTE

RELATOR

Assinatura Eletrônica

Apelação nº 0016495-73.2009.8.26.0077

Apelantes: MUNICÍPIO DE BIRIGUI e ROBSON DE ALVARENGA

Apelados: MUNICÍPIO DE BIRIGUI e ROBSON DE ALVARENGA

Comarca: BIRIGUI 2ª Vara Cível

VOTO Nº 12.478

Ação declaratória de inexistência de obrigação tributária acessória. Município de Birigui. Proibição aos tabeliães e escrivães de lavrarem instrumentos, escrituras ou termos jurídicos sem o prévio recolhimento do ITBI, impondo-lhes a obrigação de transcrição da guia de recolhimento do imposto nos instrumentos ou termos jurídicos, sob pena de multa. Impossibilidade. Matéria legislativa de competência privativa da União (CF, art. 22, XXV). Competência do Tribunal de Justiça de organizar suas secretarias e serviços auxiliares e de exercer controle sobre atos e serviços auxiliares da justiça, abrangidos os notariais e os de registro (Constituição Estadual, arts. 69, II, b e 77). Precedentes. Impossibilidade, ademais, de exigir o imposto antes da ocorrência do fato gerador, que se dá com o registro da transferência da propriedade no Registro de Imóveis. Sentença de procedência. Pleito do autor deduzido em recurso adesivo de majoração dos honorários advocatícios de sucumbência. Admissibilidade. Recurso do Município não provido. Recurso adesivo do autor provido.

Trata-se de ação declaratória de inexistência de obrigação tributária acessória em que pretende o autor, Tabelião no 2º Tabelião de Notas e de Protesto de Letras e Títulos de Birigui, a declaração de inexistência da obrigação acessória imposta nos arts. 14 e 15 da Lei Municipal nº 2.563/89, consistente na exigência, verificação e transcrição do pagamento de ITBI por ocasião da lavratura de escrituras públicas referentes a negócios envolvendo direitos sobre imóveis, bem como para o fim de afastar a possibilidade de aplicação da multa prevista no art. 18, parágrafo único, da Lei Municipal nº 2.563/89.

A r. sentença julgou procedente o pedido, declarando a impossibilidade de se exigir do 2º Tabelião de Notas e de Protesto de Letras e Títulos de Birigui a comprovação do recolhimento do ITBI por ocasião da lavratura de escrituras públicas referentes a negócios envolvendo direitos sobre imóveis. O réu foi condenado ao pagamento das custas e despesas processuais, além de honorários advocatícios de R$ 510,00.

Apelou o Município pretendendo a reforma do julgado, argumentando que nada impede que a lei tributária escolha um dos atos ligados à hipótese de incidência para considerar como sendo o momento da ocorrência do fato tributável.

O autor interpôs recurso adesivo requerendo a majoração dos honorários advocatícios de sucumbência.

Foram apresentadas contrarrazões aos recursos.

É o Relatório.

Impugna o autor a obrigação imposta pela Lei Municipal nº 2.563/89, que prevê:

“Artigo 14 – Os tabeliães e escrivães não poderão lavrar instrumentos, escrituras ou termos jurídicos sem que o imposto devido tenha sido pago.

Artigo 15 – Os tabeliães e escrivães transcreverão a guia de recolhimento do imposto nos instrumentos ou termos jurídicos que lavrarem.

[…]

Artigo 18 – O não pagamento do imposto nos prazos fixados nesta lei sujeita o infrator à multa correspondente a 100% (cem por cento) sobre o valor do imposto devido.

Parágrafo único – Igual penalidade será aplicada aos serventuários que descumprirem o previsto no artigo 14”.

É certo que o art. 156, II, da CF, atribuiu aos Municípios a competência para instituição do imposto sobre transmissão inter vivos, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição.

No entanto, o Município de Birigui ao legislar sobre o recolhimento do ITBI criou obrigações aos titulares de serviços notariais e de registro, invadindo competência privativa da União (CF, art. 22, XXV).

E também invadiu competência do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Isso porque, o art. 69, II, b, da Constituição do Estado de São Paulo, prevê que compete ao Tribunal de Justiça organizar suas secretarias e serviços auxiliares, velando pelo exercício da respectiva atividade correcional, dispondo o art. 77, também da Constituição do Estado de São Paulo, que compete ao Tribunal de Justiça, por seus órgãos específicos, exercer controle sobre atos e serviços auxiliares da justiça, abrangidos os notariais e os de registro, sobretudo visando uniformidade nas normas, de forma a impedir que em uma Comarca as questões sejam disciplinadas de maneira diversa do que em outras.

O C. Órgão Especial deste Tribunal já se manifestou nesse sentido. Confira-se:

Direta de inconstitucionalidade Lei Complementar nº 167/12 e respectivo decreto regulamentador, do Município de Cotia, a impor obrigações e prescrever penalidades a oficiais do Registro Imobiliário local, nos atos pertinentes às respectivas atribuições Inconstitucionalidade flagrante Ação procedente (TSJP – Órgão Especial – Ação direta de inconstitucionalidade 2204397-02.2014.8.26.0000 – Rel. Luiz Ambra – j. 25.03.2015).

Ação Direta de Inconstitucionalidade. Artigos 17, 18, 19 e 21, da Lei Municipal n° 323, de 27/10/2010, de iniciativa do Executivo Municipal, que dispõem sobre a imposição de obrigações e penalidades aos notários, oficiais de registro de imóveis e prepostos decorrentes de realização de atos relacionados à transmissão de imóveis ou de direitos a eles relativos. Dispositivos que violam a competência da União para legislar sobre registro público e a do Poder Judiciário para disciplinar, fiscalizar e aplicar sanções aos que exercem essas atividades. Violação ao Princípio da independência e harmonia entre os Poderes. Precedentes. Ação procedente (TJSP – Órgão Especial – Ação direta de inconstitucionalidade 0131578-72.2012.8.26.0000 – Rel. Caetano Lagrasta – j. 08.05.2013).

Incidente de inconstitucionalidade – Artigos 19 e 21 da Lei n. 11.154/91, com a redação dada pela Lei n. 14.256/06 – Obrigação imposta aos notarios e registradores de verificar o recolhimento de imposto e a inexistência de débitos relativos ao imóvel alienado, sob pena de multa – Dispositivos que afrontam tanto a competência da União para legislar sobre registro público, como a do Poder Judiciário para disciplinar, fiscalizar e aplicar sanções aos que exercem tais atividades – Ofensa específica aos artigos 5o, caput, 69, II, “b” e 77 da Constituição do Estado – Procedência do incidente para declarar a inconstitucionalidade dos artigos mencionados (TJSP – Órgão Especial – Incidente de arguição de inconstitucionalidade 0103847-15.2007.8.26.0053 – Rel. Corrêa Vianna – j. 05.05.2010).

Ademais, o fato gerador do ITBI ocorre com o registro da transferência da propriedade no Registro de Imóveis, revelando-se contrária ao ordenamento jurídico a imposição aos tabeliães e escrivães de transcrição da guia de recolhimento do imposto nos instrumentos ou termos jurídicos que lavrarem, tal como previsto na Lei Municipal nº 2.563/89.

“Ora, a transmissão da propriedade imobiliária só se opera com o registro do título de transferência no Registro de Imóveis competente, de conformidade com o art. 1.245 do Código Civil. O conceito de transmissão de propriedade imobiliária, como estabelecido na lei civil, por ter sido utilizado pela Constituição Federal para definir competência impositiva dos Municípios é vinculante dentro do Direito Tributário (art. 110 do CTN). Do contrário, a discriminação constitucional de impostos seria inócua. Logo, inconstitucional esse § 1º, bem como o art. 14, que impõe aos notários a obrigação de verificar a correção da DTI e a prova de pagamento do imposto devido. Do mesmo vício padecem os demais dispositivos relacionados aos notários ou que versem sobre pagamento do imposto antes da ocorrência do fato gerador. Inaplicável ao ITBI a figura do fato gerador fictício previsto no § 7º do art. 150 da CF por se tratar de imposto de incidência monofásica. Lembramos que essa inconstitucionalidade existe na própria Lei nº 11.154/89 que rege o ITBI (HARADA, Kiyoshi. ITBI – Aumento ilegal. Exame crítico do Decreto nº 46.228/05. RFDT 19, jan.-fev. 2006)” (Leandro Paulsen, Constituição e Código Tributário Comentados, Saraiva, 18ª edição, 2017, pg. 750).

Sobre a matéria, também já se manifestou o C. Órgão Especial deste E. Tribunal:

ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE – Artigo 14 da Lei nº 999/89, do Município de Diadema, que exige o pagamento do Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis antes do efetivo registro – Inadmissibilidade – Hipótese de incidência do imposto, nos termos do artigo 156, II, da Constituição Federal, que decorre da efetiva transmissão da propriedade de bens móveis que, por sua vez, operase com o registro imobiliário – Arguição de inconstitucionalidade acolhida (TJSP – Órgão Especial – Incidente de arguição de inconstitucionalidade 0069724-72.2015.8.26.0000 – Rel. Moacir Peres – j. 09.12.2015).

Portanto, inexigível a obrigação imposta pela Lei Municipal nº 2.563/89 aos tabeliães e escrivães.

Ressalte-se que não há ofensa à cláusula de reserva de plenário porquanto o Órgão Especial deste E. Tribunal já se manifestou sobre a matéria aqui em debate, nos termos do art. 949, parágrafo único, do CPC.

No tocante ao recurso adesivo do autor, merece acolhimento o pleito recursal, revelando-se o arbitramento dos honorários advocatícios de sucumbência em R$ 510,00 em quantia ínfima, insuficiente a remunerar o Patrono do autor, ora majorando-se a verba para R$ 3.000,00, considerando os parâmetros do art. 20, §§ 3º e 4º, do CPC/73, aplicável ao caso.

Para fins de acesso às Instâncias Superiores, considero prequestionada toda a matéria debatida, relativa à Constituição e à Lei Federal, desnecessária a menção específica a cada um dos dispositivos constitucionais e infraconstitucionais invocados e pertinentes aos temas em discussão.

Ante o exposto, pelo meu voto, NEGO PROVIMENTO ao recurso do Município de Birigui e DOU PROVIMENTO ao recurso do autor, reformando em parte a r. sentença, majorando os honorários advocatícios de sucumbência a cargo do Município de Birigui para R$ 3.000,00 (três mil reais).

Fica mantida, no mais, a r. sentença.

CARLOS VIOLANTE

Relator – – /

Dados do processo:

TJSP – Apelação Cível nº 0016495-73.2009.8.26.0077 – Birigüi – 18ª Câmara de Direito Público – Rel. Des. Carlos Violante – DJ 11.12.2018

 

Fonte: INR Publicações